quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Romantismo: Um espírito da época


O Romantismo, iniciado no fim do século XVIII, marca juntamente com a Revolução Francesa (1789) o fim da Idade Moderna e o início da Idade Contemporânea, esta perdura até os dias atuais. O Romantismo terminaria por volta de 1850, mas depois dele não faria mais sentido se referir a uma época que inclua sozinha literatura, filosofia, arte, ciência e música, pois Simbolismo, Parnasianismo, Realismo e Pré-Modernismo coexistiriam. Na Literatura, a obra Os Sofrimentos do Jovem Werther, publicada em 1774 pelo escritor Goethe, é o divisor de águas entre Arcadismo e Romantismo. A obra conta a história de um jovem que se apaixona pela noiva de seu melhor amigo. Como não pode realizar este amor, Werther se suicida. A trama resume perfeitamente a ideia central romântica, a de que a força mais poderosa da vida é o sentimento, não a razão. A obra, à época, provocou uma onda de suicídios na Europa.

Nos dias atuais, usamos a palavra romântico ao nos referirmos a uma pessoa muito sensível ou preocupada com os sentimentos do próximo. O movimento romântico, porém, foi algo bem mais complexo do que isso. Ao mesmo tempo em que foi fortemente inspirado pelos ideais de fraternidade, igualdade e liberdade da Revolução Francesa, o Romantismo foi uma reação ao Arcadismo e ao Iluminismo, que cultuava unilateralmente a razão, a ciência, a tecnologia e o progresso. Os românticos preferiam exaltar a natureza e o sentimento.

“A Revolução [Francesa] e o movimento romântico marcam o fim de uma época cultural
em que o artista se dirigia a uma “sociedade”, a um grupo mais ou menos homogêneo, a um público cuja autoridade, em princípio, reconhecia absolutamente. A arte deixa, porém, agora, de ser uma atividade social orientada por critérios objetivos e convencionais, e transforma-se numa forma de auto-expressão que cria os seus próprios padrões; numa palavra: torna-se o meio empregado pelo indivíduo singular para se comunicar com indivíduos singulares.” (Arnold Hauser, História social da literatura e da arte) 


Ou seja, o artista agora era livre para criar a própria realidade. O Arcadismo, como o Classicismo, era pura retratação da natureza, fosse esta humana ou não. Costumava-se dizer que o artista possuía dentro de si a "força criadora" e o conceito de belo, bom e verdadeiro se tornou subjetivo. O caminho liberado para que o indivíduo fizesse sua própria interpretação da existência culminou no surgimento de gênios da arte, como Beethoven, considerado um artista "livre". 

Stonehenge, William Turner

Stonehenge, John Constable

Por exemplo, as duas obras acima retratam o mesmo monumento: Stonehenge, localizado no sul da Inglaterra. Percebam as diferenças entre as duas obras, isto é, tons e cores. Cada artista via de um jeito, com uma emoção e um estado de espírito diferentes e era isto que eles procuravam valorizar em suas obras, a originalidade.

A natureza não funcionava mais como paisagem ou "pano de fundo", mas como parte da obra. Schelling, filósofo idealista alemão, dizia enxergar na natureza um "espírito do mundo", mas enxergava esse mesmo espírito na consciência humana. A natureza é um organismo, e estamos estritamente ligados a ela. Grosso modo, supondo que você acorde mau humorado amanhã, é muito improvável que você usufrua do seu dia com a mesma leveza do que se tivesse acordado de bom humor. Você tenderá a enxergar tudo como "feio", o que não significa que outros estarão enxergando da mesma maneira que você.

Ainda no Romantismo era comum a representação de cenários campestres, em oposição à vida agitada e artificial das cidades, o gosto pelo exótico e pelo pitoresco, por lugares remotos ou encantados. Interessavam-se pelas outras culturas,  a do Oriente, por exemplo. Os românticos sentiam-se atraídos pela noite, pelo crepúsculo, pelas ruínas, pela Idade Média e pelo sobrenatural, contrastando com as regras civilizatórias do Ocidente e a racionalidade sistematizada do Iluminismo.


Jangada do Medusa, Géricault

O marco da pintura romântica é a tela Jangada do Medusa, de Géricault (imagem acima). A tela, fazendo jus ao passadismo romântico, retrata um acontecimento contemporâneo trágico: o naufrágio do navio Medusa. No naufrágio, o capitão e a tripulação abandonaram o barco e deixaram 150 pessoas abandonadas em uma jangada por vários dias. A incrível luta pela sobrevivência incluiu atos de canibalismo. Apenas 15 sobreviveram.

Os românticos se atraíam pelo trágico, pelo extremo, pelo histórico e pelo antigo. Eles desafiam a dor e a estendem infinitamente. Finais trágicos com mortes ou homens e mulheres separados que se tornam padres e freiras por conta de amores mal resolvidos são típicos das obras desta época. O Romantismo não tem uma preocupação social, característica que viria a ser ferrenhamente criticada pelos realistas. Liberdade, paixão e emoção constituem um tripé sobre o qual se assenta boa parte do Romantismo, sem deixar, de maneira alguma, a fé de lado. 


A seguir um resumo com as principais características do movimento:

  1. Subjetividade (liberdade de criação);
  2. Escapismo e fuga da realidade, seja pela volta ao passado, seja pela morte;
  3. Ruptura com regras clássicas;
  4. Culto à individualidade;
  5. Idealização da mulher: ou ela é anjo ou é devassa, sempre exagerando suas qualidades;
  6. Culto à natureza, que compartilha emoções;
  7. Instabilidade;
  8. Sentimento revolucionário: desejo de reformar o mundo;
  9. Sonho, supervalorização do amor;
  10. Atração pelo exótico e pitoresco, gosto por lugares remotos e encantados;
  11. Misticismo e nacionalismo, que nos aprofundaremos na postagem sobre o movimento romântico no Brasil;

“Digamo-lo, pois, ousadamente. Chegou o tempo disso, e seria estranho que, nesta
época, a liberdade, como a luz, penetrasse por toda a parte, exceto no que há de mais
nativamente livre no mundo, nas coisas do pensamento. Destruamos as teorias, as poéticas e os sistemas. Derrubemos este velho gesso que mascara a fachada da arte! Não há regras nem modelos; ou antes, não há outras regras senão as leis gerais da natureza que plainam sobre toda a arte, e as leis especiais que, para cada composição, resultam das condições de existência próprias para cada assunto.” (Victor Hugo)

Nenhum comentário:

Postar um comentário