sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Romantismo em Portugal: Almeida Garrett (1799-1854)


João Batista Almeida Garrett (1799-1854) foi o introdutor da poesia romântica, tendo tido uma vida intensa, que se reflete na sua obra, ora num poema, ora num romance, ora numa cena poética. Sua obra romântica encontra-se nos volumes Flores sem fruto e Folhas caídas.

Este inferno de amar
Este inferno de amar - como eu amo!
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói -
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembro: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...
Almeida Garrett

Percebam a visão do amor como algo doloroso no poema, que leva à insatisfação. Notem também o individualismo, da parcialidade, quantas vezes ele não se refere a si mesmo?

Não te Amo
Não te amo, quero-te: o amor vem d'alma.
E eu n 'alma – tenho a calma, 
A calma – do jazigo. 
Ai! não te amo, não. 
Não te amo, quero-te: o amor é vida.
E a vida – nem sentida 
A trago eu já comigo.
Ai, não te amo, não! 

Ai! não te amo, não; e só te quero
De um querer bruto e fero 
Que o sangue me devora,
Não chega ao coração. 

Não te amo. És bela; e eu não te amo, ó bela. 
Quem ama a aziaga estrela 
Que lhe luz na má hora 
Da sua perdição? 

E quero-te, e não te amo, que é forçado, 
De mau, feitiço azado 
Este indigno furor.
Mas oh! não te amo, não. 

E infame sou, porque te quero; e tanto 
Que de mim tenho espanto, 
De ti medo e terror... 

Mas amar!... não te amo, não.
Almeida Garrett



Na prosa, sua principal obra é Viagens na minha terra, onde o autor-narrado alterna entre a viagem que ele faz com amigos de Lisboa à Santarém e o romance entre Carlos e Joaninha. O título da obra, Viagens, já diz muito sobre o conteúdo do livro. "Viagens", no plural, refere-se às várias reflexões políticas feitas no livro, chamadas de digressões. As tais reflexões são as viagens mentais, que dão nome ao título.

O contexto histórico da obra é a Revolução Liberal em Portugal. Os conflitos entre liberais e Miguelistas (absolutistas) dão origem a uma guerra civil, em 1930. As digressões que o autor faz têm como tema desde a situação política do país até a literatura, marcando ideologicamente a obra, criticando a corrupção da sociedade, a aristocracia e o modelo familiar burguês.

Inserida no relato, há a história de Joaninha, a "menina dos rouxinóis", cuja ação transcorre no Vale do Santarém. Os primos Carlos e Joaninha se reencontram depois de alguns anos de separação e confessam seu amor mútuo. No entanto, Carlos se recusa a rever D. Francisca, a velha cega mantinha laços de amizade com Frei Dinis, por quem Carlos nutria antipatia desde que o religioso tentara convencê-lo a mudar de partido, argumentando que o liberalismo era anticristão.

Ferido na guerra civil, Carlos é cuidado por Frei Dinis e com Georgina, com quem tem um caso. Aos poucos detalhes do seu passado vem à tona e acabam por dizer-lhe que ele é filho de Frei Dinis. Não querendo submeter a prima ao mesmo sofrimento de outras mulheres, Carlos parte, enriquece e se torna barão, numa trajetória que simboliza a derrota moral do Liberalismo. Joaquina adoece e morre sem seu amado.

No teatro, Garrett produziu peças como Catão (1822), Mérope (1841), Um auto de Gil Vicente (1842) e Frei Luís de Sousa (1844), sendo esta considerada sua obra-prima no gênero dramático.

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