quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Arcadismo no Brasil


O Arcadismo brasileiro está intimamente ligado ao chamado "ciclo do ouro" no Brasil e se iniciou com a publicação de Obras poéticas, de Cláudio Manuel da Costa. A descoberta, realizada na região de Ouro Preto, transformou Minas Gerais no maior centro econômico-político-cultural do país. Dirigiram-se para cá ouvidores, governadores, mineradores, militares, padres, comerciantes, e variados outros profissionais, entre eles muitos letrados, formados pelas universidades europeias.

O aparecimento das ideias iluministas culminou nas primeiras insurgências contra a Coroa Portuguesa, que daqui retirava toneladas de ouro e diamantes. Isto porque o Iluminismo enfatizava o progresso social dentro de uma forte moldura ética e a Coroa Portuguesa era como um vírus sugando as riquezas brasileiras. Era a Inconfidência MineiraEm 1789, um grupo de "inconfidentes" foram presos e julgados. Dentre eles, somente o Tiradentes foi levado à forca pública, em 1792.

O Arcadismo brasileiro apresenta a exaltação da natureza e de tudo que lhe diz respeito, seus poetas adotaram pseudônimos de pastores gregos ou latinos e se distanciou da Europa apenas na representação do índio como herói em epopeias, além da abordagem de temas relacionados à história brasileira: a Guerra dos Sete Povos das Missões, a fundação de Vila Rica e a descoberta da Bahia


A obra poética árcade brasileira pode ser dividida em três vertentes e vamos estudá-las nesta ordem:

  • Lírica: Características tipicamente arcádicas; o poeta é pastor, a amada é pastora; Carpe diem, bucolismo, Locus amoenus e Aurea mediocritas. Destacam-se Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto, Cláudio da Costa e Silvio Alvarenga.
  • Satírica: Reflete a insatisfação da colônia relação à administração portuguesa. A única obra representante é Cartas chilenas, de Tomás Antônio Gonzaga.
  • Épica: Poema longo que narra os feitos de um herói, geralmente um índio. Representantes são Uraguai, de Basílio da Gama e Caramuru, de Santa Rita Durão.



Tomás Antônio Gonzaga, mais importante representante da vertente lírica do Arcadismo brasileiro, chegou ao Brasil em 1751, quando tinha sete anos. Dez anos depois partiria para Portugal para cursar Direito na Universidade de Coimbra, pois queria ser ouvidor como o pai. Por ser culto e possuir brilhante inteligência, em 1782 foi nomeado ouvidor-geral em Vila Rica e encontrou a cidade em situação caótica, mas encontrou ali o antigo amigo Alvarenga Peixoto, que o apresentou aos homens cultos da cidade, como Cláudio Manual da Costa e poderosos políticos.

Conheceu nas reuniões que frequentava Maria Doroteia Joaquina de Seixas, a Marília, sua musa inspiradora. Apaixonaram-se e ficaram noivos. Gonzaga, porém, indispôs-se com o governador da época e com a Coroa. Acabou substituído como ouvidor ao saberem que ele participava de reuniões iluministas e, considerado "inconfidente", foi cumprir sentença na Ilha das Cobras. De lá, foi banido para Moçambique e jamais voltaria ao Brasil. Casou-se lá com Juliana Mascarenhas, filha de rico traficante de escravos e, como o sogro, passou os últimos anos de sua vida traficando escravos e enviando-os ao Brasil. Morreu em 1810, aos 66 anos.

Em seus poemas, imita diretamente a natureza de Minas Gerais e não uma natureza europeia. Eles estão reunidos na obra Liras de Marília de Dirceu, assinado pelo seu pseudônimo pastoril: Dirceu. A primeira parte, arcádica, tem 33 liras onde ele canta a beleza da sua "pastora", "Marília", compara-a à Afrodite e usa figuras mitológicas. O bucolismo nessa parte da obra é extremo. Já a segunda parte, pré-romântica, tem 37 liras e foi escrita na prisão. Nela o bucolismo é diminuído, mas a adoração à Marília não. Há angústia da separação, dor de viver e distanciamento amoroso, o que converge esta parte da obra para a antecipação do Romantismo brasileiro.

   Lira XXXVII 
Meu sonoro passarinho, 
Se sabes do meu tormento, 
E buscas dar-me, cantando, 
Um doce contentamento,

Ah! não cantes mais, não cantes, 
Se me queres ser propício; 
Eu te dou em que me faças 
Muito maior benefício:

Ergue o corpo, os ares rompe, 
Procura o Porto da Estrela, 
Sobe à serra e, se cansares, 
Descansa num tronco dela. 

Toma de Minas a estrada e, 
Suas faces cor-de-rosa, 
Numa palavra, a que vires 
Entre todas mais formosa.

Chega então ao seu ouvido, 
Dize que sou quem te mando, 
Que vivo nesta masmorra, 
Mas sem alívio penando. 

Outros representantes da vertente lírica do Arcadismo brasileiro são Cláudio Manuel da Costa (Glauceste), Alvarenga Peixoto (Alceu) e Silva Alvarenga.


A vertente satírica do Arcadismo brasileiro é representada, também, por Tomás Antônio Gonzaga, mas só por ele. As Cartas Chilenas são 13 cartas escritas por Critilo (aquele que critica) relatando os desmandos, atos corruptos, nepotismo, abusos de poder, falta de conhecimento e tantos outros erros administrativos, jurídicos e morais que pudessem ser relatados em versos decassílabos do "Fanfarrão Minésio" (o governador Luís Cunha Meneses de Minas Gerais até pouco antes da Inconfidência) no governo do "Chile" (a cidade de Vila Rica). 

Estes poemas foram escritos numa linguagem bastante satírica e agressiva. Confira o trecho em que o poeta descreve o governador de Minas Gerais:

Tem pesado semblante, a cor é baça, 
o corpo de estatura um tanto esbelta, 
feições compridas e olhadura feia; 
tem grossas sobrancelhas, testa curta, 
nariz direito e grande, fala pouco 
em rouco, baixo som de mau falsete; 
sem ser velho, já tem cabelo ruço, 
e cobre este defeito e fria calva 
à força de polvilho que lhe deita. 
Ainda me parece que o estou vendo 
no gordo rocinante escarranchado, 
as longas calças pelo embigo atadas, 
amarelo colete, e sobre tudo 
vestida uma vermelha e justa farda.



A vertente épica do Arcadismo brasileiro é representada por duas obras: O Uraguai, Basílio da Gama e Caramuru, Santa Rita Durão.

  • O Uraguai: Em 1759, o Marquês de Pombal decretou a expulsão dos jesuítas das terras brasileiras. Os religiosos que habitavam as Sete Missões do Uruguai resistiram e entraram em guerra contra os portugueses. A obra critica drasticamente os jesuítas, alegando que eles apenas defendiam os direitos dos índios para serem eles mesmos seus senhores. Portugueses e indígenas se dividem nos papel de herói do poema épico, sendo exaltados os feitos do General Gomes Freire de Andrade. Um padre vive mandando o índio Cacambo, que simboliza coragem, em missões que corre risco de vida. É que o Padre queria que a esposa de Cacambo, Lindoia, se casasse com seu filho, Baldeta. Certa vez, quando Cacambo retorna vivo, o padre o assassina. Lindoia, simbolizando a delicadeza, custa a creditar na morte do amado, mas aceitar se casar com Baldeta. No dia do casamento, a mulher se mata ao permitir que uma cobra peçonhenta lhe pique. É uma epopeia de cinco cantos, versos decassílabos brancos e estrofação irregular. A seguir, trecho da morte de Lindoia:

Descobrem que se enrola no seu corpo
Verde serpente, e lhe passeia e cinge
Pescoço e braços, e lhe lambe o seio.
Fogem de a ver assim sobressaltados
E param cheios de temor ao longe;
E nem se atrevem a chamá-la e temem
Que desperte assustada e irrite o monstro,
E fuja, e apresse no fugir a morte.

  • O Caramuru: Poema épico de dez cantos com versos decassílabos e esquema rítmico ABABCC (oitava-rima). A epopeia narra a descoberta da Bahia através do naufrágio de Diogo Álvares Correia, o Caramuru ("filho do trovão"). Ao chegar à costa da Bahia, ele foi recebido em uma tribo como filho de Tupã, depois de dar tiros, explodir bombas e colocar fogo em um riacho. Mais adiante, Diego vê a possibilidade de retornar à Europa através de uma nau francesa. Parte, com Paraguaçu, feia e sem graça nenhuma, deixando para trás as belas índias que haviam se apaixonado por ele, incluindo Moema, a mais bela, que atira-se ao mar em direção ao navio na tentativa de alcançar o seu amado. Ao chegar na Europa, Paraguaçu é batizada de Catarina, ambos são festejados e recebem as honras da realeza.
I

De um varão em mil casos agitados,
Que as praias discorrendo do Ocidente,
Descobriu recôncavo afamado
Da capital brasílica potente;
Do Filho do Trovão denominado,
Que o peito domar soube à fera gente,
O valor cantarei na adversa sorte,
Pois só conheço herói quem nela é forte.

Um comentário:

  1. muito bom, obrigado por ajuda varias pessoas com seu trabalho

    ResponderExcluir