Luís Vaz de Camões escreveu Os Lusíadas, epopeia publicada em 1572 que perpetua a história medieval do povo português e tem como herói Vasco da Gama (simbolizando o povo) e sua rota para a Índia.
Além da epopeia dedicada ao rei D. Sebastião, Camões é autor de uma vasta obra lírica na qual se encontram sonetos, canções e redondilhas, chegando mesmo a existir três comédia sob sua autoria.
Nascido entre 1524 e 1525, Camões participou numa expedição militar ao norte da África entre 1549 e 1551, onde sofreu um acidente pelo qual é conhecido: a perda do olho direito. Ao voltar a Lisboa, se mete numa briga e é mandada em 1553 à Índia, a pedido do rei, a fim de obter perdão completo. No regresso, sofreu um naufrágio em que só conseguiu salvar o manuscrito de Os Lusíadas. Em 1570, é encontrado pelos amigos em Moçambique, vivendo uma vida de miséria e apenas regressa a Portugal pela boa vontade dos amigos. Lá retornou à sua vida na miséria e morreu no dia 10 de junho de 1580.
Epopeia é uma narrativa estruturada em verso (poema longo) que narra, através de uma linguagem cuidada, os efeitos grandiosos de um herói, com interesse para a toda humanidade. Neste contexto, não é de estranhar que a epopeia passe a ser considerada como a expressão mais alta da poesia, é a exaltação do Homem, uma das facetas do Humanismo.
Camões se espelhou em A Ilíada e A Odisseia, de Homero, e a Eneida, de Virgílio. Porém, a inspiração nos clássicos não se limita à imitação, mas na competição com estas, procurando rivalizá-las e superá-las, exaltando Portugal através de um sentimento heroico ufanista.
Quanto à estrutura externa, as 1.102 estrofes estão distribuídas por 10 Cantos. O número de estrofes por canto varia de 87, no Canto VII, a 156 no Canto X. As estrofes têm todas oito versos (oitavas) e o esquema rítmico é ABABCC (oitava-rima). Os versos são decassílabos (dez sílabas poéticas) com predomínio do decassílabo heroico (sílabas tônicas na 6ª e 10ª sílabas).
Quanto à estrutura interna, Os Lusíadas segue o modelo das epopeias greco-latinas e está dividido em quatro partes:
- Proposição: Camões anuncia o que vai cantar (exaltar), é uma síntese daquilo que o poeta se propõe fazer. (Canto I, estrofes 1-3);
Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.
- Invocação: Pedido de ajuda à divindades inspiradas como à Tágides, por exemplo. Nestas estrofes, Camões dirige-se às Tágides, as ninfas do Tejo, pedindo-lhes que o ajudem a cantar os feitos dos portugueses de uma forma sublime (Canto I, estrofes 4-5);
E vós, Tágides minhas, pois criado
Tendes em mi um novo engenho ardente
Se sempre, em verso humilde, celebrado
Foi de mi vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado
Um estilo grandíloco e corrente,
Por que de vossas águas Febo ordene
Que não tenham enveja às de Hipocrene.
Tendes em mi um novo engenho ardente
Se sempre, em verso humilde, celebrado
Foi de mi vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado
Um estilo grandíloco e corrente,
Por que de vossas águas Febo ordene
Que não tenham enveja às de Hipocrene.
- Dedicatória: Oferecimento do poema a uma divindade importante, no caso de Os Lusíadas o narrador elogia o rei, mostrando-lhe o quão grande é o seu império, desde o Oriente até ao Ocidente. Percebam que: vós = D. Sebastião; Maravilha fatal da nossa idade = elogio; (Canto I, estrofes 6-8)
E vós, ó bem nascida segurança
Da Lusitana antiga liberdade,
E não menos certíssima esperança
De aumento da pequena Cristandade,
Vós, ó novo temor da Maura lança,
Maravilha fatal da nossa idade,
Dada ao mundo por Deus, que todo o mande,
Pera do mundo a Deus dar parte grande.
- Narração: Parte que constitui o corpo da epopeia. Os fatos são narrados cem ênfase nas peripécias do herói e nos acontecimentos históricos. É a parte mais ampla. Em Os Lusíadas, é a viagem de Vasco da Gama em direção à Índias. A narração de Os Lusíadas compreende três ações principais: a viagem de Vasco da Gama às Índias, a narrativa da história de Portugal e as lutas e intervenções dos deuses do Olimpo, com pequenas interrupções.
- Epílogo: São as doze últimas estrofes do poema. Contrastando com o tom vibrante e ufanista do início, o tom agora é de pessimismo, desencanto e de crítica à decadência do país e aos portugueses de seu tempo, esquecidos dos valores nacionais. É uma clara premonição da derrocada de Portugal, submetido em 1580 ao domínio espanhol. (Canto X, estrofes 145-156)
Exemplo:
Não mais, Musa, não mais que a Lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
Duma austera, apagada e vil tristeza.
Alguns episódios merecem destaque, são eles:
- Inês de Castro (Canto III, estrofes 118 a 135): Trata-se da história do amor proibido de Inês, dama de companhia da rainha, pelo príncipe dom Pedro. Ao saber do envolvimento do príncipe com ela, o rei dom Afonso manda executar a moça. Revoltado, dom Pedro inicia uma vingança sangrenta e coroa o cadáver de Inês, que foi “rainha depois de morta”.
Passada esta tão próspera vitória,
Tornado Afonso à Lusitana Terra,
A se lograr da paz com tanta glória
Quanta soube ganhar na dura guerra,
O caso triste e dino da memória,
Que do sepulcro os homens desenterra,
Aconteceu da mísera e mesquinha
Que despois de ser morta foi Rainha.
Tornado Afonso à Lusitana Terra,
A se lograr da paz com tanta glória
Quanta soube ganhar na dura guerra,
O caso triste e dino da memória,
Que do sepulcro os homens desenterra,
Aconteceu da mísera e mesquinha
Que despois de ser morta foi Rainha.
- O Velho de Restelo (Canto IV, estrofes 90 a 104): Na praia de Restelo, um velho profere um discurso poderoso contra as empresas marítimas de Portugal, que ele considera uma ofensa aos princípios cristãos, uma vez que a busca de fama e glória em terras distantes contraria a vida de privações pregada pela doutrina católica. O velho é a voz dos conservadores em Portugal.
"Ó glória de mandar! Ó vã cobiça
Desta vaidade, a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C'uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!"
- Gigante Adamastor (Canto V, estrofes 37 a 60): Ele aparece quando Vasco da Gama e sua tripulação se dirigem ao Cabo das Tormentas, personificado pela figura de Adamastor. Esse gigante da mitologia grega se apaixonara pela ninfa Tétis, que o rejeitara. Peleu, o marido de Tétis, transformou-o então o gigante em pedra. A figura do gigante é simbólica, pois muitos navios naufragavam na região do Cabo das Tormentas.
Tão grande era de membros, que bem posso
Certificar-te que este era o segundo
De Rodes estranhíssimo Colosso,
Que um dos sete milagres foi do mundo.
Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso,
Que pareceu sair do mar profundo.
Arrepiam-se as carnes e o cabelo,
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!
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